sexta-feira, 24 de setembro de 2010

Deixe estar como está;


Eram prédios gigantescos concluindo a rua, as portas feitas de aço desrespeitavam completamente a natureza, vidraças transpareciam a minha imagem, eu tentava arrumar meu cabelo o mais rápido possível, naquele momento a aparência importava, eu não sabia o porquê, mas parecia que eu estava indo de encontro à vida. Uma nova vida.

Havia cachorros latindo nas varandas, gatos subindo pelo corrimão e o porteiro daquele prédio enorme falava no telefone sem parar. Eu me sentia uma intrusa, minha roupa era impecável, um calçado rosa-claro, uma jaqueta prateada e um Sol deslumbrante, eu era uma nova estrela. Desisti, não sei por qual motivo nessa mesma hora apareceram mil gotas de orvalho com as mesmas escritas, eu deveria ter outra história, ser reconhecida por outros gestos, ir de encontro aos meus sentimentos, seguir a razão já não era mais a coisa certa a fazer.

Tirei a sandália e tentei virar a esquina o mais rápido possível e lá estava minha calmaria, era a visão perfeita, carros parando no semáforo, gaivotas seguindo seu rumo, a brisa batendo no meu rosto e as águas batendo nas pedras faziam todo o sentido. As horas sempre passavam voando, era inútil contar os milésimos em um mundo onde nem sequer os dias são contados como verdadeiras experiências. Era incrível como eu conseguia me manter aquecida por muito tempo, como eu conseguia ser minha melhor amiga e a própria salvadora dos meus problemas, eu mesma fazia o papel de um verdadeiro ouvinte.

Passei meu pensamento por cicatrizes abertas, doeram muito, elas custavam a sarar, aquilo parecia não ter cura, para mim já era tido como uma dor crônica fazia parte de mim e de cada buraquinho que estava aberto. Havia também espinhos gigantes que machucavam as pessoas indefesas, o que feria era saber que aquilo parecia mais incontrolável do que nunca, era uma sedução dolorosa, por que havia de ser tão atraente? Machucaria a todos com a mesma maneira e no final tudo ficaria igual, eu teria forças e poderes para sair da pior e deixar de sentir meu machucado, mas certas pessoas sairiam tão chocadas capazes de nunca mais voltar.

Chegava a ser trágico, há tempos atrás alguma coisa me convenceu de que era desesperador, meu calor atraia os mais frios, os mais necessitados de solidão, eu era o problema que todos queriam resolver a calma para os mais aflitos, o conselho para os mais necessitados, o sorriso para os mais tristes e o escudo para os mais fracos. Eu sempre estive ali, com o olhar reto, sem medo de olhar para frente, sem medo de pedir ajudar, levando o mundo nas costas. Dia sim, dia não eu tinha pose de super-heroína, o lado materno de maioria das pessoas que me cercavam.

Mas eu não fazia a mínima como eu poderia sair dos meus pensamentos inacabáveis, dos meus problemas pela metade, da minha vida mais ou menos, do meu olhar sempre buscando uma nova meta, eu não sabia como descarregar as energias, quebrar as esperanças, construir novos caminhos. Eu não sabia como criar novas experiências cientificas, novos filmes, chegar à novas fases, eu tinha um ciclo e um mundo tão fechado que eles eram capazes de fazer eu me perder sem ao menos buscar novas saídas.

A chuva começou, o ônibus passou antes que eu pudesse perceber que eu o perdi, tinha a certeza de que eu deveria continuar pensando sobre minhas histórias inacabadas em um lugar que fosse seguro para mim e para minhas perspectivas, por que o único jeito de terminá-las sem perdê-las era guardá-las em um poço tão fundo capaz de levar junto até mesmo a ferida mais dolorosa.

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